quarta-feira, 24 de dezembro de 2008

O Caminho a Diante

Ao longo deste caderno, afirmamos repetidas vezes que a única solução para a opressão gay e todas as outras opressões na sociedade é o socialismo - a conquista do poder pela classe trabalhadora e a construção de uma nova sociedade.

A opressão gay está enraizada no modo como o socialismo está estruturado e organizado. O problema não é simplesmente que muitas pessoas têm idéias erradas em suas cabeças, mas que essas idéias refletem o modo no qual a sociedade está organizada - elas possuem uma base material. A importância da família para o capitalismo e a ameaça que os gays representam para a família significa que a opressão gay é um traço inevitável do capitalismo.

A história da luta contra a opressão gay está vinculada à história da luta de classes e da luta pelo socialismo. O movimento marxista em seus primórdios via a luta pela libertação gay como uma parte necessária da luta pelo socialismo. E cada derrota sofrida pela esquerda tem sido derrota para os direitos gays e uma senha para perseguições maiores de lésbicas e gays.

Pois os oprimidos não podem alcançar a libertação por si sós. As divisões de classe, a divisão que não ousa pronunciar seu nome, perpassam a história e a prática do movimento gay. A libertação gay é uma questão de classe. Lésbicas e gays da classe trabalhadora são os mais oprimidos, aqueles que mais sofrem os preconceitos e as perseguições, os que foram mais excluídos das reformas e ganhos dos anos 60 e 70. O movimento gay, mesmo na sua expressão mais radical - a FLG -, falhou em apreciar o problema e superá-lo. A divisão fundamental que existe na sociedade, incluindo a sociedade gay, é a divisão de classes.

É difícil para a maioria das lésbicas e gays ver na classe trabalhadora e na luta pelo socialismo a saída para conquistar a libertação. Isso significa aceitar a idéia de que a esperança está no setor da população que no momento é o mais homófobico (anti-gay e anti-lésbicas).

Na maior parte do tempo, as divisões que existem no interior da classe trabalhadora - entre gays e heterossexuais, brancos e negros, homens e mulheres - parecem ser imutáveis. Contudo, cada luta da classe trabalhadora quebra essas divisões aos poucos. Quando a luta de classes atinge níveis particularmente elevados, é possível derrubar séculos de preconceito, na medida em que a luta unifica todos os trabalhadores, passando por cima de todas as divisões "normais" da sociedade.

Na Rússia pré-revolucionária, o peso da reacionária Igreja Ortodoxa russa e dos séculos de atraso levou a níveis horríveis de anti-semitismo. Os judeus eram barrados por lei de possuir terras ou assumir certos postos. As vilas judias eram sujeitas a ataques e progooms. Em toda a Europa nenhum outro lugar possuía níveis tão profundos de preconceito cego. E, no entanto, durante as revoluções de 1905 e 1917 o mais importante conselho operário criado pelos trabalhadores russos elegeu como presidente um judeu, Leon Trotsky. Os bolcheviques, que conquistaram a maioria nos conselhos no final de 1917, tinham inúmeros judeus na sua direção. No processo de conquista do poder os trabalhadores russos haviam superado séculos de preconceito.

Um exemplo mais recente é a grande greve dos mineiros ingleses de 1984-85. A organização de um grupo de apoio à greve formado por gays e lésbicas levou uma delegação de mineiros a encabeçar, com o estandarte da mina que representavam e com uma banda musical, a manifestação pelo Orgulho Gay de 1985. Esse era um setor da classe trabalhadora que, antes da greve, dificilmente poderia ser igualado pela sua tradição reacionária em questões relacionadas à sexualidade. A categoria dos mineiros é formada exclusivamente por homens. Muitos vivem em vilas isoladas, longe das influências "corruptíveis" das grandes cidades e do cenário gay.

E, apesar de tudo isso, sua experiência durante a greve levou-os a serem ganhos para o apoio aos direitos gays e, assim, muitos mineiros tiveram condições de passar a assumir abertamente a sua sexualidade. Mesmo uma greve defensiva, que foi derrotada, mostrou como a experiência da luta pode superar idéias reacionárias.

É claro que essas mudanças não são automáticas. A luta apenas cria a possibilidade para transformar as idéias. Daí porque é necessária uma organização socialista - para organizar os setores mais avançados da classe trabalhadora para argumentar e conquistar mais trabalhadores. Para discutir com os trabalhadores a necessidade da libertação gay e discutir com gays e lésbicas a necessidade de lutar pelo socialismo. Por isso precisamos de um partido revolucionário baseado na idéia do socialismo como a auto-emancipação da classe trabalhadora através da luta. Nós, da tendência Socialismo Internacional, lutamos para construí-lo.

Nós vivemos em um mundo de extremas contradições - milhões morrem de fome e desnutrição, enquanto toneladas de alimentos são destruídas pelos capitalistas do mundo todo para manter os preços elevados. Milhares de trabalhadores da construção civil estão nas filas de desempregados enquanto milhares de pessoas vivem nas ruas, sob viadutos, porque não possuem casa. O capitalismo cria um sistema com um potencial vasto, com inovações tecnológicas e invenções que poderiam criar uma sociedade de riqueza e prosperidade para todos, mas que são usados para produzir lucros e não para suprir as necessidades humanas.

O capitalismo é uma sociedade que se baseia na promoção da divisão e dos preconceitos para dividir e dominar. Mas é também um sistema que cria a classe que pode destruí-lo para construir em seu lugar um mundo novo. Essa classe, a classe trabalhadora, tem o poder para acabar com todas as opressões e com a exploração. Para isso tem que destruir as velhas instituições da sociedade e construir outras instituições, realmente democráticas, que possam dirigir diretamente a sociedade - os conselhos de trabalhadores com delegados revogáveis e o poder real para controlar o que a sociedade produz. Tal tarefa parece ser impossível agora, mas todos os períodos históricos em que a luta de classes chegou a ameaçar o domínio burguês os conselhos surgiram, ainda que em forma embrionária, como na França em 1968, Chile em 1973, Portugal em 1975, Irã em 1979, Polônia em 1980-81, para ficarmos apenas nesses exemplos. Tais lutas não surgem por decreto, mas sim da natureza do próprio sistema. Na medida em que a crise do capitalismo se aprofunda é cada vez maior a possibilidade de que movimentos revolucionários desse porte se repitam.

No presente momento, as lésbicas e os gays são vítimas de um preconceito cada vez maior, alimentado pela mídia e pela direita, principalmente com o advento da AIDS nas décadas passadas. É particularmente importante nessa situação que todos os socialistas defendam e lutem pela libertação gay. Mas também é fundamental que defendamos a necessidade da sociedade socialista, uma sociedade onde a idéia de libertação gay torna-se uma realidade palpável, e onde a divisão artificial entre "heterossexuais" e "homossexuais" possa ser derrubada de uma vez por todas.

O socialismo não se refere apenas ao fim de toda opressão e exploração. É também uma luta para que nos libertemos de todos os preconceitos e toda a repressão que distorcem e destroem a nossa sexualidade.

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